Claude Fr�d�ric Bastiat foi um economista, escritor e jornalista franc�s do s�culo XIX, cuja obra trouxe contribui��es relevantes para o desenvolvimento das ci�ncia econ�mica, pol�tica e jur�dica ao redor do mundo. 

Influenciado por pensadores como Adam Smith, Jean-Baptiste Say e John Locke, ele desenvolve na obra A Lei (1850), a partir de premissas de direito natural, sua concep��o ideal de uma sociedade de mercado. A corrente filos�fica de Bastiat, portanto, trata-se do jusnaturalismo, segundo o qual os seres humanos t�m direitos inalien�veis e irrevog�veis, que independem de qualquer legisla��o criada por governos.

Al�m disso, segundo a obra, estes se dariam a partir da �vida, faculdades e produ��o� � isto �, individualidade, liberdade e propriedade, tendo a lei como uma institui��o artificial criada pelos homens para preserv�-las, protegendo cada membro da sociedade segundo sua �tica e mantendo a converg�ncia entre diferentes grupos sociais.�

Jusnaturalismo

Por ter como premissa que esses itens referem-se aos direitos naturais, para Bastiat: �n�o � porque os homens promulgaram leis que personalidade, liberdade e propriedade existem�, mas � porque �personalidade, liberdade e propriedade j� existem que os homens fazem leis�.

O intelectual franc�s entende que o papel da legisla��o � ser �a organiza��o coletiva do direito do indiv�duo � leg�tima defesa�. Isto �, determinar como a for�a f�sica (coer��o) pode ser usada de forma leg�tima para proteger os direitos de propriedade. A ideia se assemelha, como mais tarde definiu o jurista alem�o Max Weber, � legitimidade do uso de coer��o. Para este, o Estado � o ente que, dentro de determinado territ�rio det�m o monop�lio do uso leg�timo da for�a. Isso significa que o emprego de coer��o e viol�ncia � fun��o de exclusiva compet�ncia de certos agentes investidos de poder a partir do Estado, e que esse poder � autorizado e/ou restringido mediante � lei. Assim, no entender de Bastiat, estes limites est�o em assegurar o que ele define como direitos naturais.

O autor sustenta tamb�m que os interesses dos indiv�duos s�o harmoniosos, desde que todos se limitem a sua pr�pria esfera de direito, com os bens e servi�os sendo trocados livre e voluntariamente.

A pervers�o da Lei segundo Fr�d�ric Bastiat

O contexto em que a obra foi escrita era de transi��o de sistemas mon�rquicos para a solidifica��o de uma incipiente democracia na Fran�a, marcada por disputas entre grupos ideol�gicos distintos. E, como parlamentar do congresso franc�s � �poca, Bastiat discorre sobre a possibilidade de a lei, como institui��o criada pelo homem, tamb�m ser pervertida por aqueles que a usam para outros fins. Essas finalidades seriam aquelas diferentes da defesa da vida, da liberdade e da propriedade.

Ou seja, tratam-se de pol�ticas baseadas em interesses especiais, estabelecidas sob o manto da lei, mas que rompem com a harmonia natural dos interesses e criam conflitos por privil�gios. Na defini��o de Bruno Garschagen na obra Direitos M�ximos, Deveres M�nimos, �n�o h� direito se n�o puder ser desfrutado por todos e se n�o houver a exig�ncia de um dever. Caso contr�rio, se trata de um privil�gio�.

Protecionismo

Nesse sentido, a trajet�ria cr�tica de Bastiat ao protecionismo aparece na obra. Poucos anos antes de escrev�-la, ele foi inspirado pelo sucesso da Anti-Corn Law League e juntou-se a um clube cl�ssico-liberal franc�s de economistas em defesa do fim das tarifas protecionistas, como forma de estimular o desenvolvimento regional.

Neste documento de 1844, foi alertado que a Fran�a, at� ent�o dominante, seria ultrapassada pela Inglaterra, caso os franceses n�o abolissem suas tarifas. Em A Lei, Bastiat descreve que uma tarifa de importa��o sobre o vinho, por exemplo, beneficia os produtores locais �s custas dos consumidores locais e dos produtores estrangeiros da bebida. A cr�tica se estende, ainda, a subs�dios e outros esquemas de redistribui��o, que, para Bastiat, se enquadram na ampla categoria de protecionismo. Isso porque na medida em que um grupo � �protegido� por um privil�gio especial, outros pagam para que isso aconte�a.�

Rent-seeking

Por conseguinte, a lei poderia ser pervertida, sob sua concep��o, ao ser utilizada por determinados grupos de interesses bem organizados para espoliar os demais. A causa disso, de acordo com o intelectual, seria a �ambi��o est�pida� e a �falsa filantropia�, estimulando um �estilo de vida parasit�rio, a espolia��o�. �Basta que a lei ordene e consagre a espolia��o para que esta pare�a justa e sagrada diante de muitas consci�ncias�.

Assim, Bastiat critica os socialistas da �poca, que comumente ele enfrentava no parlamento e ainda n�o tinham assumido uma vertente marxista, que � a mais conhecida atualmente � Karl Marx escreveria O Capital apenas em 1867. Ele define os �garantidores de direitos positivos�, isto �, quem demanda presta��es de servi�os por parte do Estado, de �garantidores de espolia��o de um grupo para outro�. Como o pr�prio afirma na obra, �enquanto se admitiu que a lei possa ser desviada de seu prop�sito, que ela pode violar os direitos de propriedade em vez de garanti-los, ent�o qualquer pessoa querer� participar fazendo leis, seja para proteger-se a si pr�prio contra a espolia��o, seja para espoliar os outros�.

Assim, para o autor, a produ��o legislativa tornou-se uma arma de gan�ncia respons�vel pelos males que, originalmente, a lei deveria evitar. � o que, j� no s�culo XX, o economista Gordon Tullock identificou como rent-seeking, ou a busca por renda pol�tica, algo cujo processo �, por meio do Estado, legitimado.

Estado de direito

Aqui, vale compreender que, ao longo da hist�ria, h� diversos autores com perspectivas diferentes de quais deveriam ser os direitos naturais. Para citar alguns exemplos, a obra do fil�sofo ingl�s Thomas Hobbes entende que se trata da �liberdade humana de usar seu pr�prio poder como quiser e de preservar a sua vida�. J� a cr�tica marxista se refere � constru��o da igualdade material ou substancial como um direito natural. E, por fim, o fil�sofo alem�o contempor�neo Hans-Hermann Hoppe a define como puramente a propriedade privada e suas decorr�ncias.

Dessa forma, a defesa de direitos naturais � quais forem eles � guarda rela��o com teorias normativas filos�ficas, que determinam o dever-ser. Isto �, elas se preocupam mais com a a��o do que com as consequ�ncias destas. 

O brocardo latino fiat justitia et pereat mundus (fa�a-se justi�a ainda que pere�a o mundo) resume bem a ideia do dever-ser, podendo o termo �justi�a� ser substitu�do por qualquer que seja o direito natural assumido. Contudo, essa �tica deontol�gica � contrastada com o consequencialismo, que assume a necessidade de limita��es e restri��es de qualquer direito. 

Afinal, de que adiantaria levar at� �s �ltimas consequ�ncias um determinado direito natural se o mundo perecer e ningu�m for beneficiado?

Em um Estado Democr�tico de Direito, n�o existe direito absoluto, por mais fundamental que este seja. O direito est� para a realiza��o de um valor, n�o sendo um fim em si mesmo, havendo limita��es de acordo com os resultados de suas decorr�ncias. Como, por exemplo, a viola��o do direito � vida � justificada diante de uma decreta��o de guerra.

Por conseguinte, a deontologia deve ser complementada pelo consequencialismo, e tamb�m por algum n�vel de ordem pragm�tica. Ou seja, qual a fun��o da lei, para qu� ela serve, e se ela � eficiente para alcan�ar os prop�sitos que pretende. Para analisar o cumprimento disto, a ret�rica precisa dar espa�o ao empirismo, estudos e evid�ncias.

Considera��es finais

As ideias de Bastiat podem atualmente ser representadas a partir de uma concep��o moderna de Estado de Direito, governo limitado, abertura comercial e efici�ncia regulat�ria. De fato, elas formam uma gama de institui��es inclusivas � como conceituado pelo economista Daron Acemoglu e pelo cientista pol�tico James Robinson em Por que As Na��es Fracassam � que, por sua vez, pavimentam o caminho para maior prosperidade econ�mica, social e bem-estar geral.

Conforme alguns estudos j� demonstraram, as popula��es de regi�es com maior liberdade econ�mica desfrutam de melhor provimento de servi�os de sa�de, educa��o e maior preserva��o do meio ambiente. Al�m disso, tamb�m h� causalidade entre essa estrutura institucional e maiores renda, expectativa de vida, bem como de menos mortalidade infantil, desigualdade salarial entre g�neros, desigualdade social e corrup��o.

N�o � toa, h� evid�ncias de que indiv�duos em pa�ses mais livres economicamente e politicamente s�o mais felizes. Portanto, a afirma��o de Bastiat em A Lei de que a defesa da vida, liberdade e propriedade a partir do Estado garantiriam uma �ordem social harmoniosa� encontra guarida nas evid�ncias dispon�veis.

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